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Como foi a segunda audiência da Anvisa sobre cigarros eletrônicos

Romar Beling* romar@editoragazeta.com.br

Rio de Janeiro/RS – A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) concluiu nessa terça-feira, 27, a etapa de audiências públicas relacionadas ao processo regulatório interno dos dispositivos eletrônicos para fumar (DEFs), como são chamados os cigarros eletrônicos e outros mecanismos de tabaco aquecido. A reunião foi realizada ao longo de todo o dia em auditório do Américas Barra Hotel e Eventos, na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio de Janeiro, a cerca de 30 quilômetros ou 40 minutos de deslocamento a partir da região de Copacabana.

Foi a segunda oportunidade em que o organismo, através de sua Gerência Geral de Registro e Fiscalização de Produtos Fumígenos Derivados ou Não do Tabaco (GGTAB), ofereceu oportunidade a entidades e instituições para que se manifestassem quanto à possível regulamentação e liberação de comércio desses produtos, atualmente proibido no Brasil.

Uma primeira audiência similar havia sido realizada no dia 8 de agosto em Brasília. Agora, a Anvisa fixa o prazo de uma semana a contar dessa terça para que as entidades e os organismos que se pronunciaram encaminhem seus materiais e subsídios formalmente à agência, que então dará continuidade às demais etapas previstas no processo. Com base nas considerações colhidas, será elaborado um relatório preliminar, seguido de tomada pública de subsídios e de consulta pública.

O chefe da unidade de controle de produtos da Anvisa, André Luiz Oliveira da Silva, comemorou o resultado dos debates e avaliou que informações importantes foram agregadas pelos palestrantes em relação ao primeiro momento, em Brasília. Segundo ele, ainda não existe qualquer possibilidade de estimar o prazo dentro do qual o organismo concluíra o processo.

Ao final deste, com a elaboração do relatório de avaliação do impacto regulatório, o órgão se decidirá ou pela manutenção do atual marco regulatório, a RDC 46/2009, que proíbe o comércio dos dispositivos eletrônicos, ou, ao contrário, por sua revisão, com a liberação desses novos produtos no País. “Uma decisão vai ser tomada. Nem que seja mantendo como está hoje. Não existe a possibilidade de nada acontecer, de cair no esquecimento, vamos dizer assim. Entretanto, ainda não é possível estimar prazo para que um posicionamento definitivo ocorra, em virtude dos diversos recursos que ainda serão adicionados depois dessa segunda audiência”, referiu.

Em seu entender, as manifestações e contribuições enriqueceram o processo. “São, por vezes, opiniões muito díspares, que dificultam o nosso trabalho, mas, de qualquer modo, o resultado foi muito positivo. Tivemos as opiniões dos diversos setores da sociedade, trazendo suas demandas, suas evidências, suas crenças, em certos momentos”, frisou.

*O jornalista viajou ao Rio de Janeiro a convite da empresa Souza Cruz.

Opiniões de fora

A Anvisa também pretende consultar organismos e entidades de outras nações, coletando subsídios para a tomada de decisão. “Esses momentos de consulta a outros órgãos normalmente acontecem durante o processo regulamentatório, mas numa etapa um pouco posterior. A primeira ideia é olhar em especial a situação nacional”, assinalou André Oliveira.

“A gente precisa entender o processo nacional, identificar os problemas, as possibilidades. Depois serão feitas consultas setoriais, se for o caso; consulta-se os interessados com perguntas específicas. E com certeza as agências e outros órgãos de outras nações serão consultados, de países que regularam, de países que não regularam, de países que regularam proibindo, e que regularam autorizando. Vamos ouvir todas as experiências.”

Exposição de pontos de vista pró e contra a liberação

Na audiência dessa terça, 14 pessoas haviam se inscrito e fizeram pronunciamentos na parte da manhã, apresentando argumentos técnicos ou científicos contra ou a favor da liberação. Representantes das áreas da saúde pública e organizações não governamentais (ONGs) insistiram que ainda não há, em âmbito de País, ambiente de segurança quanto a, entre outros aspectos, riscos reais desses produtos à saúde ou se podem significar um estímulo ao ingresso no tabagismo entre jovens.

Já representantes da indústria ampliaram as informações técnicas obtidas em nações nas quais os DEFs já estão regulamentados e, portanto, liberados para comércio. Mencionaram pesquisas segundo as quais os riscos à saúde poderiam ser diminuídos em até 95% com alguns tipos de novos dispositivos, por se tratar de produtos que não têm combustão e geração de fumaça, aspecto apontado como o fator de malefício do tabagismo à saúde. Em continuidade aos pronunciamentos da manhã, após o almoço, entre 14 e 18 horas, espaço foi dedicado à formulação de perguntas e depoimentos de pessoas previamente inscritas, com manifestações de representantes de diversas entidades.

Pela manhã, a primeira a falar foi a representante da Souza Cruz, Ana Lúcia Saraiva. Ela mencionou o fato de especialistas internacionais referirem que o cigarro eletrônico pode reduzir de modo significativo os riscos à saúde do consumidor em relação ao cigarro convencional. Seguiram-se, pelo lado das indústrias de tabaco ou de organismos defendendo a liberação de comércio, os pronunciamentos de Grant O’Connell, da empresa Imperial Brands; Rafael Bastos, da Philip Morris; Carlos Galant, diretor executivo da Associação Brasileira da Indústria do Fumo (Abifumo); Paulo Solmucci Jr, presidente executivo da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel); Flávio Goulart, diretor de Comunicação da JTI; e Delcio Sandi, da diretoria do Sinditabaco. Eles apresentaram subsídios ou relatos técnicos, de diferentes fontes, embasando a proposta de que a regulamentação seria oportunidade de inibir o comércio ilegal desses dispositivos no País, bem como de mitigar os efeitos do consumo de tabaco sobre a saúde da população.

Saúde

Entidades e organismos vinculados à área da saúde insistiram que ainda não haveria ambiente de plena segurança acerca de uma real redução de impacto dos novos produtos na redução do tabagismo. Mencionaram como agravante a epidemia de problemas de saúde entre jovens nos Estados Unidos decorrentes do consumo de cigarros eletrônicos, em especial de uma de suas versões. Mas os representantes da indústria observaram que tal epidemia surgiu justamente por conta de uma brecha regulatória, na demora dos Estados Unidos em regulamentar esses produtos, e advertiram que o Brasil deveria agilizar esse processo justamente para evitar que cenário semelhante viesse a ser verificado no País.

As manifestações contrárias à liberação de comércio na manhã dessa terça vieram de Larissa Figueiredo, do Centro de Estudos sobre Tabaco (Cetab); Liz Maria de Almeida, do Instituto Nacional do Câncer (Inca); Alberto José de Araújo, médico vinculado ao Núcleo de Estudos de Controle do Tabagismo; Adriana Carvalho, diretora jurídica da ACT Promoção da Saúde; Ricardo Henrique Sampaio Meirelles, da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia; Stella Martins, da Associação Médica Brasileira; e Tania Cavalcante, da Comissão Nacional de Implementação da Convenção-Quadro para Controle do Tabaco (Conicq).

Sem impacto imediato sobre a produção

Uma possível regulamentação e liberação do comércio dos dispositivos eletrônicos para fumar (DEFs) não deverá ter, a curto ou médio prazos, reflexos significativos sobre a produção e comercialização da matéria-prima de tabaco no Brasil, contexto que tenderia a se repetir também em âmbito global. Essa é a opinião de Ana Lúcia Saraiva, gerente sênior de assuntos científicos da Souza Cruz, manifestada a partir de expectativa do setor produtivo no Sul do Brasil. A possibilidade de incremento no consumo do cigarro eletrônico e de outros produtos similares, incluindo os de tabaco aquecido, se verificaria em paralelo à permanência do cigarro convencional, ainda presente em praticamente todos os países, além de outras formas de consumo de tabaco.

“Nossa empresa, por exemplo, acredita num portfólio de multicategoria, que passa pelo cigarro tradicional”, salientou. Segundo ela, a própria Organização Mundial da Saúde (OMS) reconhece que haverá demanda para um bilhão de fumantes nos próximos anos. “Ele passa pelos produtos de fumo oral, que são muito famosos nos Estados Unidos e também têm um público fiel nos países nórdicos; passa pelo produto de tabaco aquecido, de maior valor agregado, e o vaporizador, cuja nicotina também vem do tabaco. Eu não vejo, e a Souza Cruz também não imagina, não prevê, impacto imediato na cadeia produtiva. A indústria está apenas se transformando, ela continua dependendo do tabaco.”

Ana Lúcia acredita na estabilidade da produção no Brasil porque, ainda que haja decréscimo no consumo, conforme ela, a população está aumentando. “Nossa empresa acredita numa coexistência de produtos de vários tipos, mas todos têm como matéria-prima o tabaco”, acrescentou. “E penso que o Brasil sai na frente principalmente porque os estados do sul são reconhecidos pela qualidade do seu tabaco. Cumpre aprimorar cada vez mais a qualidade e os tratos culturais, cuidar do solo, fazer pesquisas.”

Ana Lúcia: portfólio multicategoria
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